Nesta comunicação analiso como gênero e deficiência se articulam na produção de desigualdades no contexto brasileiro tendo por base os impactos do trabalho reprodutivo e do cuidado na vida de mulheres que são mães de pessoas com deficiência. Considero nessa análise o modo como a noção de «maternidade atípica» vem sendo articulada por mulheres de diferentes estratos sociais como forma de mobilizar afetos e demandas por direitos que considerem os constrangimentos sociais, econômicos, relacionais, entre outros que atravessam suas experiências, e que produzem e/ou intensificam desigualdades vividas pelas mulheres. Outros marcadores sociais como classe e raça têm sido largamente estudados nas Ciências Sociais, em sua articulação com a maternidade e a produção de desigualdades de gênero, especialmente no mundo do trabalho, mas poucas análises têm sido feitas tendo o eixo da deficiência como elemento de análise. Detenho-me em explorar as implicações vividas por mães de pessoas com deficiência, por entender que a própria discussão sobre dependência-interdependência-autonomia, que atravessa tanto os estudos de gênero como os estudos sociais da deficiência, não tem resolução simples quando se trata do maternar “atípico”. Coloca-se para essas mães desafios que atravessam as relações familiares, o mundo do trabalho produtivo (quase sempre interditado para as mães e para suas/seus filhas/os) e o acesso a direitos (principalmente relacionados à saúde e educação). Por outro lado, interessa também perceber como a “maternidade atípica” modifica e/ou reafirma as representações sociais sobre o maternar e emoções e ele relacionados como a culpa, o amor e o cansaço, na sua interface com a mobilização em torno do cuidado realizada na arena pública. Assim, o cuidado extrapola o espaço privado da casa para estender-se para o espaço público, desde as associações de familiares e pacientes, demandas em órgãos de governo até as redes sociais virtuais. Se por um lado, esse movimento tem impulsionado um modelo mais coletivo de perceber a deficiência e a maternidade desde sua dimensão política, por outro o ativismo materno tem se transformado em mais uma «obrigação das mães” que são vistas como aquelas que tem que “brigar pelos direitos de seus filhos”, sendo a figura da “mãe guerreira” uma das mais tensionadas nesse cenário. A análise ancora-se em dados coletados em pesquisas que realizei em diferentes contextos e momentos, ao longo dos últimos dez anos, nos quais acompanhei famílias reunidas em associações de pacientes e em contextos hospitalares, bem como em análise bibliográfica e, mais recentemente, na mobilização de mães em perfis pessoais e/ou coletivos nas redes sociais virtuais.