Durante 30 anos de pesquisa etnográfica e uma diversidade de atuações com o povo indígena Xikrin da Terra Indígena Trincheira-Bacajá, acompanhei o modo como as crianças contribuíram para a adaptação a um novo modo de vida. Retirados da floresta, se entendendo historicamente como povos da floresta e do movimento, foram levados pelo Estado brasileiro para uma vida ribeirinha e sedentária, vivendo por muito tempo em uma única aldeia, a do Bacajá. Nesta comunicação, discuto como foram as crianças que, nesta ocasião, aprenderam, com os não-indígenas a vida na beira do rio, já que seus mais velhos não dominavam as técnicas relativas à existência na beira de grandes rios. Argumento, a partir de uma análise da aprendizagem, baseada em extensa etnografia, do valor do pedir para ser ensinado, da busca por relações que permitam essa aprendizagem, e do valor dos conhecimentos (e das coisas) que vêm de Outros, ou seja, do seu regime de conhecimentos, como esse tipo de aprendizado dos conhecimentos dos outros é e foi importante e valorizado na compreensão xikrin. Demonstro assim como o aprendizado protagonizado pelas crianças durante anos de conhecimentos relativos aos rios, em contraste com os pequenos fluxos de água das florestas, permitiram por décadas a pesca e a navegação, que uniu aldeias e os Xikrin do Bacajá às cidades onde buscam serviços, tais como educação e saúde, e mercadorias. Abordo então os impactos da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, e como esta tem levado à perda do rio. Finalmente, discuto como, já crescidas, essa geração, assim como suas crianças, se vêem se voltando, dessa vez com seus mais velhos, novamente à floresta, abrindo novas aldeias mais distantes do rio, andando pelas estradas e pela própria mata para as roças e a coleta, e voltando a enfatizar a caça, retomando conhecimentos que pareciam ter ficado para a história desse povo.