Ponencia

“A Água é uma promessa que aparece de 4 em 4 anos”: a escassez hídrica como categoria político-antropológica

Parte del Simposio:

SP.26: Agua y Energía en antropología: sobre acceso, usos,desigualdades y poder

Ponentes

Juliana dos Santos Nunes

Universidade Federal de Pelotas

A presente comunicação tem a intenção de apresentar a pesquisa de doutorado em andamento, realizada a partir dos referenciais teóricos e metodológicos da antropologia (Peirano, 1995) visando trazer os problemas relativos à questão das águas na cidade do Capão do Leão, sul do Rio Grande do Sul, especialmente a zona rural do município, junto às comunidades de pequenos agricultores familiares assentados pela luta da terra, desde 1993, nos Assentamentos Construtores da Palma e 24 de Novembro, levando em consideração os modos de saber-fazer praticados pelas famílias, especialmente a produção agrícola e as relações hidrossociais (Camacho; Camargo, 2019).
As comunidades dos assentamentos ocupam em torno de 442 hectares da antiga Fazenda da Palma, que pertencia à Universidade Federal de Pelotas (Loner, 1997), onde produzem em regime de economia familiar; cada núcleo tem 20 hectares para sua própria produção (Ribeiro; Salamoni, 2011). Por lá passam as águas do Arroio Padre Doutor, Arroio Teodósio, pequenas barragens, além de estar próximo ao Canal São Gonçalo, o qual já conta com captação de água potável, porém não alcança essas comunidades.
Apesar das diversas narrativas dos pequenos agricultores afirmarem que vivem rodeados pelas águas, pensada aqui em sua multiplicidade (Blaser, 2019), especialmente entre o Arroio Teodósio, as barragens e o canal São Gonçalo, as mesmas encontram-se escassas, não somente em tempos extremos de calamidade, especialmente no verão, mas também pela dificuldade de acesso para irrigação das plantações, consumo e qualidade de potabilidade.
Assim, podemos estender a reflexão para pensar sobre uma “estética política” (Abèlés. Badaró, 2015) em torno da dificuldade de acesso à água, tornada promessa a cada nova eleição, segundo a narrativa de uma agricultora assentada, ao afirmar que “a água virou uma promessa que se renova a cada quatro anos”, ou seja, a escassez hídrica é uma categoria política-antropológica para compreendermos os meandros da distribuição e acesso a esses corpos d’água.
Portanto, desejo mostrar as controvérsias e dissensos que envolvem as comunidades rurais e a questão da distribuição desigual das águas, entre a construção política da escassez, tornada evidente em tempos quentes, relativa abundância durante os meses de inverno, a inadequação para consumo humano e animal, além das promessas em torno do acesso à potabilidade em meio a uma paisagem que conta com diversidade hídrica.