No Brasil, os conflitos e a violência no campo e na cidade estão diretamente vinculados a apropriação privada e ilegal de terras públicas e devolutas, objeto de interesse de grandes empreendimentos de base desenvolvimentista que contam com a anuência e participação do próprio Estado. Na região norte do estado de Minas Gerais, as disputas por apropriação e uso dos recursos naturais têm se constituído como centro aglutinador dos interesses de classe e assumido uma estrutura complexificada entre agronegócio e áreas protegidas na bacia média do rio São Francisco. As políticas de modernização do campo e de compensação ambiental nas décadas de 1960 e 2000, confinaram comunidades tradicionais quilombolas, vazanteiras e pesqueiras, nas margens e ilhas deste mesmo rio, denominadas, também, como Terras da União e Áreas de Proteção Permanente. Com ascenção da extrema direita no Brasil, o cenário político e econômico se reconfigurou através do fortalecimento da agência ruralista e de sua retórica convergente com a esfera discursiva do racismo ambiental – antiambientalista, autoritária e racializada (ASCELRAD, 2018). Nesse contexto, a violência contra as lideranças destes grupos étnicos, pesquisadores e mediadores, se intensificou. A presente proposta visa, a partir de dados etnográficos, apresentar a reconfiguração do agronegócio e do modus operandi do segmento ruralista na região, assim como as estratégias de defesa territorial dos grupos e os desafios do trabalho antropológico junto aos povos e comunidades tradicionais. Observa-se que: a) a omissão e inoperância do Estado frente a regularização fundiária dos territórios tradicionais no médio São Francisco e em relação as questões agrárias e ambientais, tem aumentado a violência no campo e intensificado os conflitos na região; b) as políticas de privatização da gestão de áreas protegidas e a chegada das fazendas de energia solar sinalizam na direção de um terceiro mecanismo político do encurralamento e; a reorganização das formas de apropriação das Terras da União, pelo segmento ruralista, demanda uma nova leitura antropológica do agronegócio.