A pandemia de Covid-19 desencadeou efeitos socioeconômicos que direcionaram atenções globais para as fragilidades dos nossos sistemas urbanos. Para os grupos sociais que vivem em territórios conhecidos como Favelas no Rio de Janeiro e Comunas em Medellín, a falta de planejamento urbano tornaram a situação ainda mais desafiante – com efeitos variáveis a partir de marcadores de gênero, cor e classe social – como atestado por instituições como a Organização Mundial da Saúde.
Esta perspectiva nos leva a compreender as condições que trouxeram um aprofundamento das desigualdades sociais que afetam as populações das periferias urbanas da América Latina. Nestes cenários de precariedades situados às “margens do Estado”, grupos locais se auto-organizaram em formas de urbanismo e fazer-cidade trazidas por iniciativas referidas por uma vasta gramática de “colaborações, ajudas e suporte”.
Com base em interlocuções etnográficas estabelecidas com lideranças comunitárias em favelas do Rio de Janeiro desde 2015 e comunas em Medellín desde 2021, meu trabalho se concentra sobre distintos formatos de mobilização comunitária, alguns mais espontâneos e orgânicos, e outros mais institucionalmente estabelecidos. Compreendo estas formas de planejamento insurgente como “urbanismos pandêmicos” regidos por formatos horizontais de solidariedade. Alguns baseados em redes de relações previamente estabelecidas, e outros em uma reorganização de frentes de trabalho. Contudo, todos orientados pela perspectiva de que seria necessário desenvolver tais formas de solidariedade devido à sensações de “negligência” e “abandono” do governo.
O objetivo desta apresentação é explorar as modalidades de urbanismo e agência política produzidas ao redor de variadas mobilizações comunitárias em cidades latino-americanas durante a pandemia de Covid-19. Com base em aportes da antropologia e da sociologia urbana e da “virada das mobilidades” na teoria social, nesta apresentação pretendo explorar contribuições teórico-metodológicas a partir de uma pesquisa socio-etnográfica sobre políticas do cotidiano, (i)mobilidades relacionais, arranjos sociotécnicos, cuidado comunitário e imaginação política.
Com base em perspectivas socio-etnográficas sobre as políticas urbanas e as suas (i)mobilidades, esta pesquisa se direciona à observação de redes comunitárias desenvolvidas nestes territórios durante as perturbações pandémicas – através de uma abordagem metodológica comparativa e multissituada. Minha questão de pesquisa é compreender as potencialidades e limitações dessas iniciativas. Sustento a hipótese de que em cidades como Rio de Janeiro e Medellín, redes de resistência urbana anteriormente constituídas contra a violência do Estado foram reorganizadas em um repertório para garantir o direito à vida.
Em termos metodológicos, me baseio em técnicas como a observação-participante, entrevistas semi-estruturadas e a descrição de situações sociais a partir de interações com lideranças, articuladores, voluntários e parceiros dessas mobilizações.
Minha contribuição teórico-metodológica ao campo das etnografias urbanas se apoia na definição de “mobilização comunitária”. Mobilizando diferentes recursos, ideias e eixos infraestruturais em torno de um propósito comum, indivíduos e grupos sociais (re)produzem miríades de redes e conexões para gerar benefícios econômicos, sociais e políticos – desafiando estruturas de poder e criando valor sociopolítico por meio de inovadoras convergências de mobilidades.