“Na Materialidade Todos os Documentos se Comunicam”. A sentença que intitula essa apresentação é de Walter Benjamin. Do filósofo da teoria da narração que nos ensinou que o fundamento de todo arquivo é a violência: ele é feito de ruínas, de escombros sob os quais jazem os oprimidos. Benjamim mimetizou a violência do arquivo para repará-la. A crítica ao arquivo equivale a escavar o monumento bárbaro da civilização; a escrever histórias a contrapelo, contra-histórias do humano como prática de libertação. Numa palavra, a antropologia tem debatido longamente a hermenêutica dos diferentes arquivos para entender as formas pelas quais eles se comunicam, respaldando-se ou se contradizendo. Que o arquivo colonial se lastra na violência é bem sabido por quem estuda as materialidades da diáspora africana e dos sistemas escravistas nas Américas. Valendo-me de meu trabalho de campo em antropologia da diáspora africana nas comunidades de afrodescendentes religiosos gaúchos de Rio Grande, São José do Norte e de Pelotas (RS), discutirei como tenho estudado as materialidades afro-locais em contrapelo, no intuito de fazê-las comunicarem-se e narrar histórias vivas, calcadas no presente. Histórias que contribuam à luta antirracista.