Na conjuntura da crise democrática latino-americana, a retórica populista e antissistema, fez seu experimento brasileiro com o governo Bolsonaro, no período de 2018 a 2022, o qual, em 2023, ainda é vivamente sentido. A ideologização-partidária epidêmica bolsonarista é um produto político e cultural do avanço internacional da extrema-direita nazifascista e sua política da morte, que visa o domínio total e, consequentemente, o amordaçamento das maiorias minorizadas. Os diferentes ou os que não se encaixam no padrão moral bolsonarista, qual seja, homem, branco, heterossexual, burguês, conservador e cristão devem ser excluídos e/ou eliminados física e/ou simbolicamente. O exemplo brasileiro, durante as eleições de 2018, com Bolsonaro ainda candidato à presidência, mostra o aviltamento da coisa política com os usos dos discursos de ódio que objetivam a eliminação do convívio com os diferentes; das mentiras que alheiam e distorcem a realidade; e da não-participação nos debates políticos, promovendo o silenciamento e o cessar da política, pela não existência do conversar e do convencimento mútuos. Já presidente, em março de 2019, durante um jantar diplomático nos EUA, Bolsonaro afirmou que o objetivo de seu governo era desconstruir e desfazer ações e políticas dos governos anteriores. Promessa cumprida no percurso do alastramento da crise sanitária covidiana, com o desvirtuamento do Ministério da Saúde e a condução da política pandêmica pela Presidência da República. O resultado foi a prorrogação política da pandemia por um governo mercador da morte. Esta proposta de trabalho objetiva, portanto, apresentar uma análise pautada no conceito arendtiano de mal banal acerca da atuação do governo Bolsonaro como o principal agente de disseminação de um vírus mortal. Eleito através de mentiras, governou mediante o uso delas, fazendo-as sua principal ferramenta de disseminação do novo coronavírus no país. Ao priorizar, deliberada e intencionalmente, o falso dilema entre economia e vida, causou mortes políticas – mortes que poderiam ter sido evitadas com tomadas de decisões alinhadas aos preceitos constitucionais – e favoreceu uma ínfima parcela da sociedade que lucrou com o adoecimento e a morte dos demais. Ao conferir preferência ao trato com poucos e não com muitos, distorceu o verdadeiro espaço da política, que é o do “livre-conversar-sobre-alguma-coisa-com-outros”. Bolsonaro, contrariamente ao cargo de presidente de uma República Democrática, agiu como um autocrata, em suas constantes tentativas de golpe político, facilitadas pelo cenário de necessidade de distanciamento físico, conhecido, popularmente, como isolamento social. Na concepção arendtiana de política, isolamento é impotência. Por isso, a necessidade pandêmica de isolamento social favoreceu o governo Bolsonaro, que utilizou o terror como ferramenta política para realização ideológica do extremismo de direita. Para além da catástrofe político-sanitária, nos deparamos com uma catástrofe moral, em um contexto de ideologização-partidária epidêmica covidiana bolsonarista. Assim, o governo Bolsonaro, politicamente indiferente com a manutenção do espaço da pluralidade e com a responsabilização pelo mundo, rotinizou o espetáculo e a banalização do sofrimento e da morte, executando necropolítica, numa explícita banalização do mal, ao transformar a pandemia num palanque político. Tanto que se manteve competitivo durante todo o pleito presidencial de 2022.