Pensar a infância no campo da Saúde Mental requer a contextualização da sua construção histórica, ocupando um lugar na produção do saber e do poder psiquiátrico. Ao tomarmos a infância em uma perspectiva histórica, percebemos como foram aparecendo certos fenômenos, como a patologização e a medicalização da infância, assim como o cenário onde as práticas de cuidado foram produzidas no Brasil, incluindo o estatuto da Criança e do Adolescente, a Reforma Psiquiátrica e as Políticas de Saúde Mental Infantojuvenil implementadas no âmbito do SUS. Assim, percorrer o trajeto da experiência de crianças na saúde mental, no que se refere ao uso de medicamentos, pode ocorrer de vários modos, mas tem sido reproduzido, particularmente, a partir de uma perspectiva adultocêntrica. Assim, aproximando-se da dimensão da experiência, é possível desenvolver formas de narrar os seus modos de viver e de compreender a vida. A proposta metodológica deste trabalho segue a política de pesquisa entendida como o pesquisarCOM, deslocando o eixo central da ciência, hegemonicamente alicerçado em práticas de totalização e dominação, para a produção de redes polifônicas, compostas por saberes, práticas, entidades, atores diversos, sempre em movimento de construção de mundos e sujeitos. Partimos do referencial teórico metodológico da cartografia como método de pesquisa-intervenção, tomando como formas de registros o diário de campo falado; o diário de campo escrito (realizado em diferentes momentos); as entrevistas e o registro dos grupos. A partir do encontro de um corpo ficcionado pela pergunta “o que dizem as crianças sobre o uso de medicamentos psicotrópicos” a pesquisadora foi ao encontro das crianças, utilizando o Guia GAM como disparador e produtor de pistas para fazer falar o lugar da medicação na vida das crianças e adolescentes. Foram construídas narrativas que permitiram a aproximação com o movimento das crianças dentro dos grupos realizados em um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e sobre o que dizem a respeito do uso de medicamentos. A oferta farmacológica integra um dispositivo de controle e uma nova máquina de produzir subjetividades, respondendo a uma ideia de sujeito neuroquímico. As crianças são produzidas no interior de um conjunto heterogêneo de práticas, discursivas e não discursivas, e a infância atua como dispositivo nessa produção. Sob o argumento de que as crianças precisam de cuidado, sustentando as práticas de prevenção, atualizamos os modos de governar. O governo dos corpos infantis ocorre pelo uso de psicofármacos, que continuam a serviço dos dispositivos higiênico-pedagógico, jurídico e médico. À criança coube o lugar do sujeito em perigo ou sujeito perigoso e, quando aproximamos essa criança daquela que encontramos na saúde mental, vemos duas forças agenciando suas existências. Ela tanto assume a infância que precisa ser cuidada e protegida quanto a infância que carrega a periculosidade e ameaça certa ordem, a da própria infância como vulnerável e incapaz, o que retroalimenta o uso de fármacos como possibilidade de cuidado e restabelecimento da ordem. A aposta em trazer a criança para o centro do cuidado, criando formas para que possam expressar e comunicar o que sentem, pode permitir a transformação das