Ponencia

Música e transmissão de conhecimento no Terreiro de Mãe Amara

Parte del Simposio:

SP.9: Antropología de la música en América Latina y el Caribe

Ponentes

Tiago Sá Leitão dos Santos

Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, Museu Nacional - Universidade Federal do Rio de Janeiro

Tambores são ouvidos, inúmeras pessoas entram em uma casa branca no alto de uma ladeira e se reúnem na sala diante desses instrumentos musicais. Em seguida, uma mulher negra inicia uma invocação, seguida por um canto, os tambores voltam a soar e as pessoas formam dois círculos no centro do ambiente. Esse é um ritual público de culto aos Orixás, na cidade do Recife, estado de Pernambuco (Brasil), em um templo de culto aos Orixás (divindades) e aos Eguns (ancestrais), chamado de Ilê Obá Aganjú Okoloyá ou, como é mais conhecido, Terreiro de Mãe Amara. É neste cenário que venho desenvolvendo minha pesquisa que segue caminhos iniciados por trabalhos como José Jorge de Carvalho (1984) e Rita Segato (1984), os quais foram desenvolvidos a partir das relações entre rituais, música e Orixás, também na cidade do Recife. Assim, meu trabalho busca contribuir com o entendimento dos processos de transmissão de conhecimento musical, a partir de uma antropologia do ritual, me distanciando de uma perspectiva cognitivista e me aproximando do que Tim Ingold (2010) chama de “educação da atenção”. Para isso, segui modos de pensamentos rastreáveis através de listas, tabelas, fórmulas e receitas (Goody, 2012), a partir dos quais pude analisar conteúdos e estruturas (Vansina, 2010) das práticas da tradição oral investigada. Logo, tomando a relação da música com a transmissão de conhecimento como elemento central da pesquisa, pude compreender a importância da organização social para a construção da noção de continuidade da tradição, identificando como um sistema de hierarquia, cujo poder é passado por herança consanguínea, influencia na validação de práticas musicais de noviços e estabelece um campo religioso entre diferentes templos na cidade. No Recife é recorrente que a liderança de uma determinada casa religiosa convide a liderança de uma outra para os seus rituais, o que revela também uma forma de reconhecimento da importância dela no seu campo religioso. Isso evidencia o reconhecimento mútuo das práticas musicais, uma vez que, estando em outra casa, essa liderança é convidada a cantar e tocar. Além disso, seguir estas práticas musicais e religiosas me levou a ter contato com a cena cultural e artística recifense, uma vez que muitos dos músicos religiosos também atuam no circuito cultural e artístico dessa cidade, estabelecendo uma relação entre práticas musicais e ocupação de centros urbanos.