A segunda metade do Século XX foi marcada pelo aumento de tensões entre Estados Unidos e União das Repúblicas Socialistas Soviéticas em escala global. Especificamente na cena latino-americana, a possibilidade efetiva de perda de zonas de influência para o Bloco Oriental por conta dos desdobramentos da Revolução Cubana implicou que, em um arranjo eficaz e preciso, Estados Unidos assumisse a posição de Estado de contrainsurgência. A ideologização das Forças Armadas latino-americanas foi instrumento cardinal para a consolidação de golpes de Estado que deflagraram a instauração de ditaduras civil-militares em toda a região. Esta guisa de administração dos Estados-nação latino-americanos lançou mão de parâmetros da Doutrina de Segurança Nacional para a imposição de políticas autoritárias. Nesta conjuntura, a manifestação de contrariedade aos regimes militares gerou prisões arbitrárias, desaparecimentos e assassinatos de cidadãos, abonando um legado de silenciamento e terror para as sociedades nas décadas subsequentes. Com a implementação de medidas que viabilizaram reaberturas políticas em países como Argentina, Brasil e Paraguai e processos de transição para as democracias, os graves crimes cometidos contra as populações passaram a ser detectados pelas sociedades latino-americanas. Neste cenário, as políticas de memória surgem como perspectiva para a visibilização do terror gerado ao longo dos regimes pela via da reconstrução da memória coletiva, possibilitando o reconhecimento dos traumas políticos experienciados e a ressignificação das identidades latino-americanas. Com o escopo de compreender as acepções atribuídas às experiências vividas, o lugar psíquico concedido às memórias individuais no transcurso dos anos, e os significantes que oportunizaram – ou não – a simbolização dos traumas políticos experienciados, para a realização desta pesquisa, foi proposta a efetivação de dez entrevistas com cidadãos argentinos, brasileiros e paraguaios que testemunharam as ditaduras civil-militares em seus respectivos países. A coleta de dados ocorreu por meio do uso da metodologia de exposição da História Oral – amplamente aplicada no universo das Ciências Humanas e Sociais – em vias de historicizar os acontecimentos testemunhados pelos sujeitos que os recontarão desde o prisma da memória. Entre as hipóteses levantadas, a partir da identificação da trama de significações atribuídas aos eventos por parte de cada entrevistado, pressupõe-se que este estudo poderá promover o discernimento de contrastes e similitudes entre os regimes implementados nos três países, contribuindo à tessitura de novas correlações teóricas entre o coletivo e o individual, entre a dimensão psicológica e a sociológica, mediante a análise comparativa de diferentes testemunhos.