No trabalho de campo, venho observando por mais de 1 ano um grupo de frequentadores de um botequim carioca, localizado na cidade do Rio de Janeiro, no Bairro da Glória, o La Paris. Utilizando a luneta do pensamento de Roberto DaMatta, o botequim pode ser a Casa e também pode ser a Rua. Nessa obra o autor debate como ocorre, no Brasil, a interação entre o espaço público e espaço privado, discutindo como esses espaços são socialmente construídos e como as pessoas se comportam de maneira diferente em cada um deles. Com essa perspectiva, é possível entender o botequim como um espaço privado para alguns grupos e público para outros, tudo dependendo do ator observado.
Esse trabalho é uma pesquisa qualitativa, onde quero demonstrar, por meio das descrições das minhas observações realizada no Bar La Paris, um dos vários bares do bairro da Glória, as regras e as normas para o “Coloca na conta”, “Pendura essa” e para o “Vai deixar para depois?” presentes nas relações do gerente, funcionários e clientes.
Busco compreender e aprender os diversos valores desse grupo. Seguindo os passos de Bronislaw Malinowski descritos em seu livro “Crime e Costume na Sociedade Selvagem”, entendo que o verdadeiro problema não é estudar como a vida humana se submete as regras, pois isso não ocorre, mas sim estudar como as regras se submetem à vida humana.
Assim, no texto é descrito duas situações envolvendo um cliente chamado Sorriso e o gerente Sandro. Na primeira, Sandro expressa publicamente sua indignação com a dívida de Sorriso, usando a fofoca como uma forma de pressioná-lo a pagar. Na segunda situação, Sorriso envia presentes ao bar e, eventualmente, pede uma caixa de cerveja para pagar depois, demonstrando a expectativa de reciprocidade.
Logo, o “coloca na conta” é um fenômeno social complexo, onde a reciprocidade desempenha um papel crucial, afetando não apenas recursos materiais, mas também o status moral e a reputação dos envolvidos. Essas trocas não são opcionais, mas obrigatórias para manter relacionamentos e status sociais.
No texto, quis deixar claro que o “coloca na conta” é um fato social completo, onde muito mais do que recursos materiais estão envolvidos nessas trocas obrigatórias. Nesses dois casos, é possível observar a complexidade que envolve o botequim, onde credor e o devedor podem variar de acordo com a situação. No La Paris, em algumas situações essa lógica se inverte e o bar passa a dever ao cliente, mesmo que essa inversão seja por um breve período de tempo, pois o cliente terá que pagar o que recebeu.