Por meio de etnografia documental de longa duração sobre a relação entre militância feminista e produção de conhecimento antropológico venho buscando sistematizar e dar visibilidade à constituição da antropologia feminista no Brasil como um campo epistemológico vocacionado para a produção de teorias etnográficas sobre alteridades complexas, com a preeminência da categoria analítica gênero como princípio da vida social humana, implicadas em processos de distribuição desigual de poder. Tal campo vem sendo constituído desde os anos 1980, a partir de diferentes estratégias, destacando-se como principais: a nuclearização, a divulgação e a reprodução geracional. Neste processo, foi possível identificar nichos irradiadores da produção antropológica-feminista brasileira em diferentes regiões do país, constituindo linhagens antropológico-feministas e redes de pesquisa. Embora nem todas as protagonistas pioneiras deste campo se autoidentificam como feministas, suas produções relacionam-se com o que se convencionou denominar de “problemática de interesse feminista”, entendida como a preocupação teórica e analítica acerca e/ou da condição feminina e/ou da assimetria de gênero e de poder, bem como da articulação entre os diferentes marcadores sociais da diferença e a produção de desigualdades. Observei, mais detalhadamente, se há – e de que maneira se estabelece – uma relação entre militância e produção de conhecimento antropológico nas suas trajetórias, visando compreender como influenciaram o campo de estudos antropológicos feministas. Diante destas questões, nesta comunicação resgatarei aspectos importantes da memória e da história dos mais de 30 anos do campo feminista e de gênero na Universidade Federal de Santa Catarina, nicho antropológico-feminista do sul brasileiro, que consolidou a universidade como um dos principais polos produtores de conhecimento científico-político interdisciplinar feminista no país, a partir da identificação de pesquisadoras-chave para o desenvolvimento do campo da antropologia feminista em Santa Catarina. Como características deste saber-fazer antropológico feminista é possível se falar da produção de uma antropologia engajada a partir de alguns princípios significativos como a preocupação com a ação transformadora, o apego ao empírico atravessado pela reflexividade e a mobilização dos afetos e do coletivismo nos processos de produção de conhecimento. Apresenta-se, assim, um campo consolidado, cada vez mais plural, seja temática, teórica ou metodologicamente e que enfrenta importantes desafios atuais na sua reprodução, os quais, argumentarei, deverão ser enfrentados pela imaginação ética feminista.