O turismo é um dos motivadores do constante fluxo de pessoas na região conhecida como três fronteiras, entre Argentina, Brasil e Paraguai. Realizei trabalho de campo na região buscando compreender as estratégias de resistência adotadas pela população indígena Mbya Guarani no trato cotidiano com atores do turismo transitando por seu território. Um aspecto importante nessa relação foi a instalação de hotéis e resorts de luxo no local conhecido como “600 hectareas” — área de mata contigua ao Parque Nacional Iguazu (onde estão as Cataratas) — território tradicional dos Guarani e que teve o plano de ocupação alterado possibilitando que parte da zona de mata fosse cedida a redes hoteleiras. Atualmente, quatro comunidades indígenas estão nessa área: Yry Apu, Jacy Porã, Ita Poty e Tupã Mbae ocupando pouco menos da metade dos 600 ha do território original. Exploro os enredamentos nas relações entre hotéis, floresta e comunidade descrevendo as estratégias adotadas pelos guarani para resistir ao cercamento produzido dentro de seu território. Os processos envolvidos na tentativa de transformação das 600 de área indígena para “complejo hotelero” são contínuos. Em 2005, depois de as 600 terem sido loteadas para hotéis, criou-se um plano de inclusão dos guarani nas redes de turismo através do projeto MATE (Modelo Argentino para Turismo y Empleo, uma cooperação entre Canadá e Argentina). O turismo envolve os guarani a partir de três frentes principais: pela intrusão/presença desses atores no território e o desvio cotidiano praticado por adultos, crianças, jovens nos caminhos e caminhares; no artesanato e nos senderos como modos de relacionar-se com os turistas dentro das aldeias cuja responsabilidade quase sempre cabe aos jovens adultos; nas percepções e lutas políticas dos caciques (suas diferentes estratégias) sobre a relação entre aldeias, paisagem, território e turismo/hotéis. O turismo é uma questão importante para as pessoas nas aldeias, é tematizado em reuniões com políticos locais e entre lideranças. Para muitas famílias, a venda de artesanatos é uma fonte de renda básica, principalmente com os cortes em auxílios promovidos por políticas de austeridade, por isso são bem-vindas as iniciativas que busquem capturar parte do movimento do turismo. Porém, essa também é uma fonte de disputas internas, pois as oportunidades acabam sendo escassas e beneficiando algumas poucas famílias. Apesar de todo o impacto desse cercamento pelos hotéis, da devastação de suas zonas de mata, da presença de atores hostis, da tentativa de enquadramento por turistas e moradores locais, os guarani têm suas próprias estratégias para contornar e se esquivar dessas capturas conseguindo modular o tipo de relação que escolhem manter com esses atores. Se nas relações políticas mais amplas, o turismo soa como algo totalizante, descrevo o modo como os guarani escapam desse assédio, amenizando o impacto do turismo em suas vidas cotidianas. Desenvolvo a análise deste material a partir de duas posições comuns nas esquivas mbya: o não-entendimento e a invisibilidade. Sem poder controlar completamente o fluxo de turistas nas aldeias e nos caminhos, os guarani adotam posições comuns no modo de se relacionar com esses outros em seu território.