Esta comunicação explora os “emaranhados ambíguos” (Williams, 2013) que compõe as intersecções entre desejo, fantasia e racialidade no trabalho sexual entre homens nas margens do Rio São Francisco, Bahia, Brasil. Desde 2021, tenho realizado trabalho de campo, buscando entender etnograficamente as intersecções entre sociabilidade, sexualidade e marginalidade. O trabalho sexual, que tenho observado etnograficamente nas margens do Rio São Francisco, envolve uma série de questões e fantasias sexuais em relação aos corpos negros e masculinos. As categorias “cafuçus” e “marginais” eram constantemente acionadas quando eu questionava sobre os rapazes que faziam algum tipo de trabalho sexual. A origem das categorias, apesar de incertas, remonta à mestiçagem e à mistura de identidades raciais no Brasil, especialmente ligada ao termo “cafuzo”, que refere-se a indivíduos com ascendência mista, geralmente provenientes de pai negro e mãe indígena, ou vice-versa (Marques, 2015), uma noção que está intrinsecamente ligada às estruturas coloniais e à herança da escravidão (Stoler, 1995; Freyre, 1977), desembocando em constantes ambivalências referentes aos corpos negros. No entanto, nas margens do Rio São Francisco, longe de serem identidades fixas, essas categorias são fluidas e negociadas nas interações eróticas do território. Os corpos dos trabalhadores sexuais não são estáticos; eles são performatizados, adaptados e moldados em resposta às expectativas e desejos dos clientes, através dessas categorizações raciais. Essas observações destacam uma fluidez nas identidades de gênero e sexualidade, desafiando noções rígidas e binárias. No âmbito do trabalho sexual, a agência dos trabalhadores é melhor percebida através dessas performances. As performances vão além das aparências físicas, envolvem gestos, linguagem corporal e até mesmo a tonalidade da voz, todos cuidadosamente ajustados para se alinhar com a imagem de masculinidade desejada pelo cliente. O corpo torna-se, assim, uma tela onde as expectativas e fantasias dos clientes são pintadas e projetadas. Essas performances não só ressaltam uma fluidez das identidades de gênero e sexualidade, mas também destaca a agência dos meninos do rio no contexto de dissidência sexual e de gênero. Essa abordagem ressalta a natureza fragmentada e segmentada das identidades, mostrando como os sujeitos podem ocupar diferentes posições no código social em momentos distintos. Esse entendimento mais amplo das territorialidades vai além do espaço físico, penetrando no tecido social e cultural que envolve o trabalho sexual. O trabalho sexual se revela como um campo complexo, onde as representações de masculinidade, virilidade e desejo são constantemente remodeladas nas interações das margens do Rio São Francisco.