Este trabalho apresenta os caminhos pelos quais uma pesquisa que se dedica a compreender processos vinculados as políticas públicas de esporte e lazer da cidade de Porto Alegre vêm se modificando, através de diferentes construções metodológicas e da reflexividade oriunda do trabalho etnográfico, o que diz sobre as próprias práticas políticas investigadas, especialmente sobre noção de participação. Visando superar abordagens utilizadas nas sociologias clássicas muito presentes nos estudos sobre políticas públicas de esporte e lazer no Brasil, em grande parte pautadas pelas relações de poder e seus significados ou por abordagens de modelos de análise , optamos por abrir espaços para novas perguntas e estranhamentos, estudando “nas” políticas, seguindo e convivendo com atores em ação, valorizando a abordagem antropológica.
A pesquisa foi se constituindo através das imersões no campo e nas relações com autores/as da chamada sociologia pragmática (Bruno Latour, Luc Boltanski e Daniel Cefaï) e de autores/as brasileiros/as do campo da antropologia de práticas políticas (Karina Kuschnir e Alexandre Werneck). Chamamos atenção para três pontos da construção da pesquisa onde as viradas e mudanças na forma de olhar para os processos ficam mais claros.
(1) A delimitação dos espaços e atores pautou a escolha do campo de pesquisa e a busca por acesso a espaços políticos institucionalizados. No entanto, a convivência e circulação com os atores em ação nos desafiam a olhar, de forma mais simétrica, para os laços políticos mobilizados e os trabalhos de comprovação em torno de princípios de equivalência atuantes nas situações de disputas vivenciadas, considerando os constrangimentos e os imperativos que se apresentam.
(2) O olhar voltado para determinados casos em disputa possibilitou uma superação do olhar pautado pela lógica linear e regular da disputa e manutenção do poder, a partir de estruturas metafísicas pré-definidas. Ao invés de pressupor a existência de coletivos, a pesquisa se pauta na construção de coletivos em diferentes situações, o que constantemente coloca em cena a grandeza do pesquisador na relação com outros actantes.
(3) Olhar para os atores em ação na política tem sido fundamental à compreensão dos processos de construção das políticas públicas, isto porque, os sujeitos-actantes passam a transpor estas fronteiras institucionais levando a necessidade de questionar, em vários casos e suas trajetórias, não quem é legitimado, mas de que forma, por quem e por quanto tempo se legitimam na política. Assim, esta virada da pesquisa não parte de grupos restritos de sujeitos políticos, mas da ação de “atores legitimados nas políticas”.
Estas três inflexões descritas dizem sobre as mudanças ocorridas na experiência etnográfica articuladas com os estudos no campo da sociologia pragmática. Elas apontam para outras perguntas e novos debates acerca da participação nas políticas públicas de esporte e lazer no Brasil, em especial nas situações de constante rearranjo dos grupos, com entradas e saídas de atores que nos levam a questionar os processos de legitimação e não os atores legitimados.