As coleções Karajá do Museu Nacional no Rio de Janeiro acompanhavam a história da instituição e eram referências para a história do Brasil e dos povos indígenas do rio Araguaia. No dia 2 de setembro de 2018 todo esse patrimônio sofreu um impacto direto causado por um incêndio acidental no palácio de São Cristovam, na Quinta da Boa Vista, local das exibições do Museu Nacional e onde se encontrava grande parte das coleções guardadas pela instituição. No caso das coleções etnográficas, todo o acervo que se encontrava no prédio foi atingido pelo fogo.
Diante da perda inestimável destas coleções, muitas delas com mais de duzentos anos de história, foi preciso reinventar novos cominhos para as pesquisas em andamento. Iniciamos uma nova fase de pesquisa nos museus de etnologia da Alemanha no segundo semestre de 2022 com o objetivo de levantar informações, estabelecer contatos e relações com museus na Alemanha que guardam em seus acervos coleções do povo Iny-Karajá.
O trabalho se concentrou em Berlim, no Museu de Etnologia que foi fundado em 1873 como Museu Real de Etnologia (Königlichen Museum für Völkerkunde zu Berlin) que guarda coleções bastante antigas, herdadas da Câmara Real de Arte Prussiana (Prussian Königlichen Kustkammer). O foco da pesquisa em Berlim se deu por vários motivos, sendo um dos principais as pesquisas envolvendo o rio Araguaia nos projetos que consolidaram a antropologia e etnologia no século XIX.
Ao estudar a coleção Iny-Karajá de Berlim foi possível se voltar para a história do Araguaia e das relações entre indígenas e não-indígenas a partir da perspectiva de dados acumulados por naturalistas como Paul Ehrenreich e Wilhelm Kissenberth. Durante o período da pesquisa identificamos e analisamos 587 peças de uma coleção que se aproxima de 1000 peças e que hoje é a coleção Iny-Karajá mais antiga que se tem conhecimento em museus etnográficos depois do incêndio do Museu Nacional no Brasil.
Os resultados deste trabalho foram apresentados ao Setor de Etnologia e Etnografia do Museu Nacional que tem trabalhado na construção de uma plataforma digital com dados sobre as coleções etnográficas de povos indígenas do Brasil que estão em museus estrangeiros. Portanto, a pesquisa na Alemanha colaborou diretamente com atividades associadas ao projeto de reconstrução do Museu Nacional ao mesmo tempo que viabilizou a formação de material de campo a ser compartilhado com as famílias Iny-Karajá interessadas no tema dos museus e coleções.
Em suma, a pesquisa realizada foi fundamental para compor a etapa de organização dos dados e informações a serem compartilhadas com os indígenas no Brasil. Ao abrir os acervos e compartilhar os conhecimentos e informações sobre as coleções, temos a importante oportunidade de produzir novos diálogos e relações para repensar as práticas dos Museus, produzindo novas cooperações e parcerias que estejam em sintonia e respeito com as formas de vida e conhecimentos indígenas, criando critérios e protocolos compartilhados entre as instituições e os coletivos interessados em conhecer e se apropriar de sua própria história.