Esta apresentação diz respeito ao “problema da urna eletrônica” tal como mobilizado por Bolsonaro e seu entorno e como isto se constituiu a partir de uma aplicação de operações de guerra híbrida no Brasil. Mostrarei como em princípio a “impressão do voto” era uma pauta da esquerda que foi sequestrada por Bolsonaro em 2018 quando ele passou a mobilizar a ideia de que o sistema eleitoral brasileiro era fraudável. Nesse momento ele assegurou um duplo movimento: de um lado bloqueou o discurso petista de que “eleição sem Lula é fraude” e garantiu que o PT endossasse o processo eleitoral; de outro lado criou uma cortina de fumaça que bloqueou a ação tanto da oposição quanto das autoridades eleitorais quanto às fraudes eleitorais que ele próprio realizava, e que ainda correm em processo no Superior Tribunal Federal (conhecido como o “Inquérito do WhatsApp”). Passado o momento da eleição de 2018, contudo, Bolsonaro continuou mobilizando a questão das urnas como forma de desestabilizar a eleição, desta vez a de 2022, porém utilizando outros argumentos e artifícios. Entre eles, o de que haveria um problema na escrita do código-fonte no software das urnas, com vários indícios de seu “hackeamento”. Sua demanda passava pela participação das Forças Armadas como agente de certificação das urnas, colocando militares em processos de “auditoria do código-fonte”. No entanto, esta foi uma operação que, no jargão militar, pode ser definida como “falsa bandeira”, imputando a outro um dano que o próprio agente causa. Entre outros elementos, os militares já estavam “embarcados” na tecnologia da urna: são consorciados com a empresa que faz a criptografia do seu sistema e são os responsáveis por assegurar nas suas instalações a biblioteca do código-fonte das urnas. Um dos pontos que pretendo mostrar é que esta mobilização que Bolsonaro fez visava camuflar os reais interessados no processo de desestabilização eleitoral: os militares. Como conclusão, pretendo enunciar uma reflexão antropológica, a partir desse “caso etnográfico”, de Bolsonaro como uma espécie de artefato militar, cuja agência espetaculosa operava uma espécie de magia ilusionista sobre o processo eleitoral.