A Constituição Federal de 1988 alçou crianças e adolescentes à condição de sujeitos de direitos e instituiu a igualdade de filiação. Como parte desse novo momento histórico, legislativo e social, em 1990, foi promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que, embebido da doutrina da proteção integral, atribuiu aos infantes todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, com absoluta prioridade. A prática, contudo, se revelou composta por rupturas e continuidades. No campo do direito à convivência familiar, a expectativa inicial apontava para um ideal de justiça social, a partir do fortalecimento das famílias de origem e do encaminhamento para adoção como medida excepcional. Essa percepção, representou uma tentativa de ruptura com a lógica anterior, que culpabilizava as famílias vulnerabilizadas. A prática, contudo, revelou a continuidade, evidenciando que as famílias destituídas do poder familiar ainda eram aquelas marcadas por recortes de classe, raça e gênero. Esse cenário, aprofundado pela lógica neoliberal de enfraquecimento do Estado, fez com que a adoção fosse cada vez mais endossada como solução ao problema do acolhimento. Com isso, eclode o discurso de que, se uma família não exerce o modelo de cuidado esperado, o melhor é que a criança seja realocada, com a maior brevidade possível, em um núcleo familiar que corresponda aos padrões socialmente esperados. Para que essa realocação seja satisfatória, porém, é preciso desvincular esse infante de sua família de origem, tida como uma ameaça, na medida em rememora todos os conflitos sociais e de classe que perpassam a dinâmica adotiva. O modelo de adoção brasileiro, então, condicionou a ampliação dos direitos do adotivo ao apagamento dos vínculos e afetos pré-adoção. Assim, apesar dos avanços normativos, as escolhas da legislação estatutária parecem atuar como um meio de consolidar desigualdades já existentes na sociedade de classes (Fonseca, 2006). Nessa conjuntura, o que se propõe é o avanço das investigações sobre adoção, com intuito de encontrar respostas ao seguinte questionamento: Como conjugar interesses em uma sociedade desigual? Para tanto, pretende-se tencionar o tema das adoções abertas e investigar como a modalidade poderia ser incorporada no Brasil. No modelo vigente, fundamentado na ruptura limpa, as adoções têm operado a partir de uma lógica de antagonismos, que em última análise promove e contribui para as desigualdades e criminalização da pobreza, além de colocar crianças e adolescentes como objetos de disputas. Almeja-se, então, pensar um modelo adotivo que conduza a um enfoque pautado nos direitos do adotivo, a partir da hipótese de que a adoção aberta teria a potencialidade de promover a recuperação do caráter relacional no sistema adotivo, revelando-se mais garantista, por estar baseada na ideia de consenso e cooperação mútua e possibilitar a integração e participação de todos os membros da tríada adotiva – adotados e suas famílias biológica e adotiva. Se como coloca Fonseca (2006), é inerente à adoção que ela opere a partir de uma lógica de diferenças de classes, a abertura funcionaria como uma espécie de mitigador, que procura trazer certo equilíbrio a nova relação de parentesco constituída.