Neste artigo discuto a hipótese de que há uma normatividade na dissidência, que dita não apenas os códigos e os padrões de conduta, mas que marginaliza os corpos já socialmente tão estigmatizados. Para corroborar e defender o meu argumento, adotei como referência importantes literaturas acerca das sexualidades dissidentes, buscando o diálogo entre autores renomados no campo das sexualidades, tais como Judith Butler, Michel Foucault e Paul B. Preciado, além da contribuição da minha própria experiência pregressa como uma insider, fruto do meu trabalho de campo realizado durante os dois anos de Mestrado em Ciências Sociais na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Assim, intento provocar uma reflexão sobre as relações entre diferentes atores sociais adeptos de práticas sexuais denominadas BDSM (acrônimo para os pares bondage e disciplina, dominação e submissão, sadismo e masoquismo) e o lugar dos corpos que não são identificados segundo um padrão ideal de beleza nem na sociedade como um todo e nem no universo dos praticantes de dinâmicas não-normativas. Se por um lado podemos observar uma busca por um sentimento de pertença ou um lugar de acolhimento e identificação, de outro vemos que há uma performance estética, de orientação mercadológica, que é responsável pela construção do fascínio visual e pela expectativa que mobiliza sujeitos a ingressar nesses percursos dissidentes. Essa orientação mercadológica por si só já exclui uma grande parcela da população que não possui condições econômicas para arcar com os altos custos das parafernálias que envolvem esse universo dos prazeres e que vão desde brinquedos e objetos sexuais, até vestimentas e acessórios de couro e látex, importantes na composição das personagens que irão performar nesse meio dissidente. Parto, então, do pressuposto de que existe uma performance estética e cultural estruturalmente construída que se perpetua mesmo entre dissidentes sexuais e que acaba por submeter corpos gordos, negros e maduros ao escrutínio, preconceito e segregação, e, portanto, engendra práticas de gordofobia, racismo e etarismo, muitas vezes de forma explícita e outras vezes de forma sutil na opacidade das paletas de cores dos processos de subjetivação.