Os espaços da América Latina ocupados por coletividades organizadas sobre formas dissidentes das orientadas pelo capitalismo globalizado foram objeto de inúmeras intervenções de Estados Nacionais, agências de fomento e cooperação técnica e ajuda humanitária, missões religiosas. Diferentes ideologias (de bases religiosas, científicas, políticas) conceberam os modos de vida destas coletividades como deficientes, hipossuficientes ou como modelos de futuro altamente idealizados que solucionarão per se o devir de um mundo entrópico.
Tais ideologias, pautadas em concepções do que seja bem-estar e melhorias na vida de indígenas, camponeses afrodescendentes e/ou crioulos, orientaram em maior ou menor medida as perspectivas defendidas por regimes de governo variados voltadas à intervenção nos modos de viver e atuar simbólica e economicamente nos espaços territoriais por eles habitados. Desde os anos 1950, marcados pelo nacional-desenvolvimentismo até às transformações deslanchadas dos anos 1990 para o presente, tanto em termos das regulações internacionais e nacionais (com as novas constituições de muitos países na América Latina, e com os parâmetros normativos da gestão neoliberal nas políticas governamentais), vimos a aceleração de um padrão de crescimento econômico baseado na exportação de commodities sob modelo (neo)extrativista, especialmente no cenário dos anos 2000, acompanhada pela financeirização da terra, pela expansão de infraestrutura voltada a essa modalidade de exploração econômica, pela reconfiguração mercantilizada de antigos espaços de extrativismo sob a forma de destinos turísticos.
Paralelamente, assistimos à crescente tomada da atenção aos direitos das coletividades afetadas por corporações transnacionais, já frente a tais movimentos políticos e econômicos, povos indígenas, comunidades afrodescendentes e camponeses, ou populações trabalhadoras urbanas afetadas por grandes empreendimentos têm produzido contra narrativas, formas de luta e ocupado mais ou menos a esfera pública em luta pela autonomia como um valor fundamental. A crescente articulação internacional desses coletivos em movimento, sua presença na esfera pública global, sua imaginação de futuros são igualmente aspectos que se valorizará nas apresentações de trabalhos desta mesa, que se focará tanto nas ações de segmentos sociais dominantes representados ao nível dos poderes de Estado (tomado em seu sentido ampliado), quanto nas ações contra hegemônicas das coletividades atacadas por tal padrão de exploração imperial.